top of page
Buscar
Paula Oliveira

"Rosa enjeitada", uma mulher que teceu

Embora nunca me tenha sentado ao piano para tocar, quando me sento ao tear sinto que me sento ao piano. Tenho a necessidade de endireitar as costas, esfregar as mãos, olhar em frente como se fosse verificar a pauta. Quando me sento ao tear, inevitavelmente, vejo o rosto da Maria João Pires. Ouço-a algumas vezes, enquanto teço. Ouço-a também, outras vezes, enquanto não teço. Gostava de estar sentada ao tear e ver a meu lado a Maria João Pires, a tocar, no seu piano. Uma espécie de dueto. Alucinação a minha. Que ousadia tão grande. Eu, uma mera aprendiza, num dueto com a Maria João Pires… são ideias que me ocorrem enquanto teço.

Enquanto teço, a mente vagueia, anda entre fios, premedeiras, vai aqui e ali, corre para a frente e para trás como a lançadeira. Às vezes, segue as palavras de algumas canções, permite mesmo que a melodia interfira no ritmo de tecer. É incrível o sentir enquanto se tece. Ouvi a Rosa enjeitada e, de repente, era como se eu, tecedeira, naquela minha circunstância de momento, fosse a tal “mulher que sofreu”. Quase chorei. Tive de soltar as premedeiras, largar a lançadeira, levantar-me…



NOTA: sugiro que a sua leitura se faça acompanhar de J.S. Bach: Cello Suite No. 1 in G major, BWV 1007 “Prelude"

Comentarios


bottom of page